María del Rosario Acosta López (ed) (2016)

Resistencias al olvido. Memoria y arte en Colombia

Bogotá: Ediciones Uniandes, 344 páginas.

Reseñado por Andrés Montoya
Universidad de los Andes, Colombia


Resistencias al Olvido (Resistências ao esquecimento) é uma compilação de onze ensaios que explora as possibilidades que a arte oferece para pensar o passado violento colombiano, indagando sobre as particularidades da construção da memória em um país que padeceu por mais de cinquenta anos de uma guerra ininterrupta. A compilação agrupa os resultados das pesquisas do grupo interdisciplinar Ley y Violencia, liderado pela filósofa colombiana María del Rosario Acosta e criado no ano de 2011 pelos departamentos de filosofia da Universidad de Los Andes de Bogotá e pela Paul University de Chicago.

A antropóloga e historiadora María Victoria Uribe Alarcón realiza uma reflexão no início do livro sobre o surgimento de um interesse inusitado na relação entre a arte e a violência na Colômbia. Essa afirmação pode ser difícil de assimilar levando em conta que, neste país, a relação entre arte, violência e memória remete à sua história como nação: as imagens de mártires cristãos desmembrados na época colonial, as pinturas de batalhas contra a Espanha durante o processo de independência e as obras de arte moderna sobre os massacres e assassinatos no século XX são exemplos disso. O que se pode afirmar, porém, é que, atualmente no país, além de numerosos estudos que buscam pensar as relações entre arte e violência, também os artistas colombianos que abordam o conflito possuem na contemporaneidade um amplo acesso a mercados e museus de renome internacional.

Os artistas que estão em foco em Resistencias al Olvido, são aqueles especialmente interessados em temas como as desaparições forçadas, ou a perda de um ente querido devido à violência. Esse é o caso de Aliento, uma série de retratos desenhados por Oscar Muñoz que se tornam visíveis através de um assopro em um espelho; da instalação de vídeo Treno, na qual se veem peças de roupa flutuando em um rio; de A flor de piel de Doris Salcedo, que faz uma homenagem a uma enfermeira torturada; ou o de Sudarios, no qual Érica Diettes mostra uma série de retratos de mulheres que perderam um ser querido.

No primeiro ensaio, Las fragilidades de la memoria. Duelo y resistencia al olvido en el arte colombiano. Muñoz, Salcedo y Echavarría, (As fragilidades da memória. Luto e resistência ao esquecimento na arte colombiana. Muñoz, Salcedo e Echavarría), María del Rosario Acosta López exalta o papel da arte na memória. Ela argumenta que a arte é um primeiro passo para que uma cultura atravesse as portas de sua história e se ressignifique. Ainda que essa tese possa ser pensada através das obras analisadas de Muñoz, Salcedo e Echevarría, ela parece ser demasiado romântica para as complexas dinâmicas do panorama colombiano que deseja abordar, já que, no momento em que entram em contato com o público, as obras e ações artísticas às quais se refere, não geraram manifestação e tampouco se converteram em emblemas de luta.

Um caso contrário à exaltação que faz Acosta López das obras de sua análise é o ensaio Entre “memoria historica” y “arte”: La guerra que no hemos visto y el anonimato de los excombatientes (Entre “memória histórica” e “arte”: a guerra que não vimos e o anonimato dos ex combatentes), escrito por María Juliana Rojas Berrío, que insiste no silêncio da mostra La guerra que no hemos visto, proposta pelo artista Juan Manuel Echevarría. A autora afirma que a obra falha nos seus objetivos de “seguir as fibras do tecido emaranhado da violência que asfixia o país” (218), já que não ajuda a confrontar nem a assumir a dor do outro. A escritora explica que seu maior erro é não explicar mais detalhadamente sobre as pinturas da mostra e apenas apresentá-las como resultado das oficinas realizadas durante quase dois anos com ex-combatentes. É importante confrontar essa crítica e perguntar o que compõe uma exposição. pois durante seu funcionamento, foram empreendidas numerosas atividades pedagógicas, nas quais o público participava ativamente e onde se convidava à contextualização conjunta das obras. Nessas atividades chegaram a participar alguns dos ex-combatentes que realizaram as pinturas, o público em geral e alguns especialistas.

Dentre os ensaios do livro, resultam especialmente interessantes En las fauces de Saturno. Tres paseos melancólicos por el caballero de la Fe de José Alejandro Restrepo (Nas fauces de Saturno. Três passeios melancólicos pelo cavaleiro da Fé de José Alejandro Restrepo), escrito pelo advogado e filósofo Daniel Moreno e Otra mirada en las relaciones entre arte y memoria en la obra de Oscar Muñoz (Outro olhar nas relações entre arte e memória na obra de Oscar Muñoz) escrito pelo filósofo Miguel Gualdrón. No primeiro dos ensaios se destaca o papel da fé e do sacrifício nas memórias violentas. Aqui Moreno faz uma leitura semiótica da obra de Jorge Alejandro Restrepo onde se contrastam textos e imagens e se propõe conexões entre as obras e temas filosóficos. A obra não é para ele uma simples desculpa para falar sobre Kierkegaard, Benjamin, Agamben e Walser, mas, através desses filósofos, o autor desenvolve algumas conexões que se mostram elementares para a construção da própria obra de arte. Dessa forma, se dedica a entender e desvelar os múltiplos sentidos do trabalho de Restrepo sem pretender exaltar ou refutar seu trabalho. No segundo ensaio, Gualdrón faz um trabalho minucioso de análise da curadoria de Protografías, realizada José Roca e Maria Wills ao redor da obra de Oscar Muñoz. A contribuição reflete não apenas sobre a própria memória, mas também sobre o ato mesmo de criar memória, apresentá-la e/ou representá-la. Através deste enfoque, Gualdrón consegue realizar um estudo sobre o caráter incompleto, não eterno e transformável da memória.

O contraste de visões e as distintas formas com as quais cada autor se aproxima dos temas da arte e da memória resultam muito relevantes em um momento em que múltiplas iniciativas artísticas a respeito do tema são gestadas na Colômbia. Ainda que o livro sugira um diálogo entre distintas disciplinas e campos de estudo, como a Antropologia, o Direito, a Literatura, a Sociologia e os Estudos Culturais, ele se ocupa especialmente dos problemas filosóficos de cada uma das obras de arte as quais faz menção. Assim, pensadores como Nancy, Benjamin e Hegel se convertem em eixos primordiais das análises nele presentes. Os ensaios questionam a postura crítica dos artistas e suas produções e permitem a abertura de debates sobre a função das dinâmicas artísticas em meio ao conflito. Por essas razões, pode ser considerado um livro particularmente interessante para acadêmicos que buscam estabelecer problemáticas filosóficas através da prática artística, para juristas interessados em entender as possibilidades da reparação simbólica assim como para artistas que estabelecem suas criações a partir dos desafios originados de conflitos sociais.